O escândalo na CBF e a utilização de provas digitais ou eletrônicas na legislação brasileira

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Foto: Divulgação

É cada vez mais evidente a importância das provas digitais para a resolução de crimes e fraudes. No recente caso do menino “Henry”, a versão de inocência da mãe e do padrasto ruiu após o aparecimento de conversas no WhatsApp entre a mãe e a babá da criança. A prova digital foi fundamental para a prisão do casal e a mudança de depoimentos que antes os inocentava. E fotos, mesmo as apagadas, foram recuperadas na memória do celular.

Hoje a apreensão legal de um celular permite a extração de praticamente todo o seu conteúdo. Também é possível determinar a localização através do mapeamento pelas antenas de telefonia. Álibis vem sendo destruídos quando o celular desmente a versão do investigado de que estaria em determinado local, quando as antenas indicam diferente.

Veio à tona também nos últimos dias o escândalo envolvendo o presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), Rogério Caboclo. Uma funcionária da entidade o acusa de assédio sexual e moral, além de relatar estado de embriaguez frequente. A acusação teve repercussão imediata e gravações efetuadas pela própria vítima seriam as provas irrefutáveis dos delitos cometidos. A defesa de Caboclo nega as acusações e diz que provará sua inocência.

O escândalo traz consigo uma discussão jurídica atual. Quais os requisitos de uma prova digital? Um diálogo pelo WhatsApp é uma prova digital? Uma filmagem ou gravação com o próprio celular é uma prova digital?

Legislação

A legislação brasileira aceita todos os tipos de prova, inclusive a prova eletrônica ou digital. As provas digitais, entretanto, possuem aspectos próprios. Quando se analisa a prova digital deve-se verificar a autenticidade (quem produziu a prova) e a integridade (segurança de que não houve alteração do conteúdo). Uma pessoa pode forjar uma conversa de WhatsApp com outra ou mesmo enviar um e-mail por outra pessoa, assim, a autoria digital é comprovada através do endereço de protocolo da Internet, o “IP”, de onde a prova foi gerada e de logs (guardados por provedores de acesso). Além de conversas por WhatsApp, gravações e e-mails, uma foto de celular também é uma prova digital e o exame pericial comprova sua autenticidade. 

Se pensarmos que uma prova pericial será necessária, pode-se concluir que a apuração dos fatos no escândalo da CBF será demorada. Além disso a primeira apuração da denúncia se dará por comitê interno da própria CBF, onde poderia haver influência do presidente denunciado. Qual a solução?

Compliance

Talvez seja através do “compliance”, que em uma empresa é composto pelos programas de integridade, garantindo não somente que ela respeite as leis, bem como os melhores princípios de ética e responsabilidade social em sua atuação. É algo que vai além de uma observação fria das leis, é um comportamento que define a aceitação que a empresa tem pelo mercado e pela sociedade. 

E no caso da CBF, que depende diretamente de patrocínio de várias empresas para suas atividades, as empresas patrocinadoras não aceitarão uma investigação que se arraste e não admitirão a associação de suas marcas e reputação a um escândalo de assédio sexual e moral, regado a muito álcool.

Várias empresas patrocinadoras já manifestaram preocupação com o escândalo e aguardam rápidos esclarecimentos e decisões, caso contrário, rescindirão os contratos de patrocínio. De se lembrar que recentemente a Nike anunciou que rescindiu o contrato com Neymar Jr. por denúncia de assédio contra o atleta, denúncia que ainda está em apuração interna.

Justiça

Perante a Justiça, provas concretas (digitais ou não) deverão ser produzidas para provar os fatos alegados, mas para a sociedade e mercado muitas vezes não é necessário aguardar um julgamento, a palavra da vítima e outras evidências bastam. Afinal construir uma reputação de marca é algo que se leva tempo, mas que pode se destruir em um único erro ou omissão.

Francisco Gomes Júnior, advogado sócio da OGF Advogados, formado pela PUC-SP, pós-graduado em Direito de Telecomunicações pela UNB e Processo Civil pela GV Law – Fundação Getúlio Vargas. Foi Presidente da Comissão de Ética Empresarial e da Comissão de Direito Empresarial na OAB.

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